Coluna Tim Vickery: a naturalização espanhola de Diego Costa poderá ser justificada?

Durante a recente ida do Atlético de Madrid ao Valência, os torcedores da casa hostilizaram o atacante Diego Costa dizendo que o mesmo não é realmente espanhol. Daqui a cinco meses, uma nação inteira deverá estar pronta para levantar o mesmo ponto; porém, com mais agressividade. Porque há um elemento na história de Diego Costa […]
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sambafoot_admin
2014-01-14 21:26:00

Durante a recente ida do Atlético de Madrid ao Valência, os torcedores da casa hostilizaram o atacante Diego Costa dizendo que o mesmo não é realmente espanhol.

Daqui a cinco meses, uma nação inteira deverá estar pronta para levantar o mesmo ponto; porém, com mais agressividade. Porque há um elemento na história de Diego Costa que, durante a Copa do Mundo de 2014, poderá contribuir para uma relação altamente carregada entre o atacante do Atlético de Madrid e os torcedores brasileiros.

Não é nenhuma novidade brasileiros defendendo outras seleções. Historicamente, isso já ocorreu em duas ocasiões. Uma delas foi na idade pré-globalizada. É relativamente recente – a Copa do Mundo de 1986 foi um marco importante nesse processo – que o Brasil passou a convocar jogadores que atuavam fora do país. Antes disso, uma ida para a Europa ou até para a Argentina era o suficiente para enviar o jogador à um exílio da seleção. Então por que não jogar pelo país que o acolheu? Alguns tomaram esse caminho – talvez o maior caso seja o de Mazzola, meia-atacante da seleção brasileira na Copa de 1958 que anos depois jogou pela Itália (usando seu nome real, Altafini), inclusive jogando pela Azzurra na Copa seguinte.

Esse tipo de situação – participar de jogos por mais de uma seleção – já não pode mais acontecer hoje. Mas, com a aldeia global em que vivemos atualmente, não é incomum vermos brasileiros defendendo as seleções dos locais onde atuam, como Tunísia, Togo, Japão, México, Alemanha, Espanha ou Portugal. Normalmente, esses jogadores entendem que não possuem chances de defender o seu país-natal. Se naturalizarem cidadãos dos países que os adotaram é o melhor que podem conseguir.

Houve muitas vezes um sentimento de orgulho no Brasil sobre esses casos. Há algo para se orgulhar no fato de os jogadores brasileiros descartados pela seleção serem bons o suficiente para defenderem outra nação. Provavelmente haverá casos desse tipo na Copa do Mundo. A torcida poderá pegar no pé desses jogadores caso enfrentem o Brasil. Caso contrário, suas façanhas não deverão ser alvo de qualquer hostilidade.

Mas o mesmo não vale para o caso de Diego Costa. Porque este é um jogador que poderia estar jogando pelo Brasil – na verdade, chegou a jogar pela seleção em Março passado – e poderia ter sido chamado por Luiz Felipe Scolari para os últimos amistosos antes da Copa. Ao invés disso, porém, ele optou por jogar pela Espanha – não como um prêmio de consolação, mas como primeira escolha. É uma opção ousada, especialmente levando em conta o local onde será realizada a Copa do Mundo.

O que pode estar por trás de sua decisão?

A razão óbvia para isso foi a razão como foi tratado pelo Brasil há menos de um ano atrás. Chamado para os amistosos contra Itália e Rússia, ele recebeu apenas alguns minutos em cada partida, sem nenhuma real oportunidade de mostrar do que é capaz e foi completamente ignorado para a disputa da Copa das Confederações. Seu valor subiu bastante não apenas pelo seu grande início na temporada espanhola, mas também com a contusão do atacante Fred, primeira escolha do Brasil para o ataque. De repente, Scolari passou a ter um outro olhar sobre Diego Costa. Mas, para o jogador que ficou mordido com a primeira oportunidade, não haveria uma segunda.

Mas em um nível mais profundo, talvez Diego Costa esteja vivendo sua própria identidade. Eu tenho que confessar que me levou um tempo para chegar a esta conclusão. Minha reação imediata foi de que o jogador era brasileiro e que qualquer tentativa de se passar por espanhol era falsa e artificial. Pensando mais, eu percebi que estava vendo as coisas do meu ponto de vista e não me esforçava para entrar na pele de Diego Costa. Vou explicar.

Um velho amigo meu, do Reino Unido, explica eu perfil no Twitter da seguinte forma: “As minhas opiniões são resultado de anos de experiência e uma formação universitária livre”. A minha geração (nasci em 1965) foi, em muitos casos, a primeira a chegar perto de uma faculdade – e foi tudo baseado na previdência estatal: saúde gratuita, educação gratuita. Eu posso fazer várias criticar ao meu país, mas não posso negar que ele investiu em mim. Mesmo após vinte anos no Brasil, não há nenhuma maneira que eu poderia pensar em mim como brasileiro.

Este é o tipo de pensamento que, inicialmente, eu estava erroneamente atribuindo à Diego Costa também. Mas, francamente, ele não tem razões para se sentir da mesma forma. Ele é da pequena cidade de Lagarto, em Sergipe. É um longo caminho da minha cidade adotiva, Rio de Janeiro, e não tenho conhecimento de primeira mão do lugar. Mas imagina uma infância em condições precárias – especialmente nos dias de hiperinflação (ele nasceu em 1988) e antes da introdução do Bolsa Família.

Agora, bem adaptado ao seu novo país e até mesmo com uma filha espanhola, Diego Costa prefere olhar para frente. É uma posição que tenho respeitado. Mas, no calor da Copa do Mundo, está longe de ser claro que muitos torcedores brasileiros irão mostrar a mesma tolerância – principalmente pela Espanha ser uma das principais rivais do Brasil e com a possibilidade das duas seleções se enfrentarem tão cedo, nas oitavas de final.

Diego Costa reconhece que sua eventual falta de controle emocional é consequência das falhas em sua educação. E seu temperamento vai ser realmente posto à prova nesta Copa do Mundo. Ele poderá estar vestindo a camisa vermelha da Espanha, mas, principalmente se jogar contra os anfitriões, toda “la furia” estará direcionada contra ele.

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